Já vou avisando: possivelmente serei xingado ao final do texto, mesmo que ninguém comente.
Quem me conhece sabe que sou extremamente sãopaulino. Mas, para esse assunto em especial, vou imaginar que não exista nenhum time no Brasil, porque a questão da Copa do Mundo não deve ser tratada com paixão torcedora, mas com criticidade cidadã.
Em 2007, o Brasil recebeu a oportunidade de sediar uma Copa do Mundo de futebol, o esporte mais amado no país, e que não ocorria em terras tupiniquins desde 1950, quando perdemos a final para o Uruguai. Desde então, há um notável conflito entre os defensores e os opositores à realização do evento.
Os argumentos dos primeiros são até plausíveis: em se tratando de um dos maiores acontecimentos regulares do planeta, todas as atenções estarão voltadas para nós, o que garantiria uma propaganda gratuita e positiva, maiores investimentos estrangeiros, aquecimento das atividades turísticas nas cidades-sede e, principalmente, alto retorno financeiro e social para a população. Este último porque haveria investimentos em infra-estrutura e consequente melhoria na qualidade de vida.
Por outro lado, também desde a escolha do Brasil ouvimos inúmeros jornalistas esportivos, e de grande importância nesse campo, cravando que a Copa seria uma faca de dois gumes: bem organizada, traria resultados positivos; mal estruturada, elefantes brancos jamais ou raramente vistos na nossa história.
E hoje, quatro anos depois do anúncio e a apenas três de 2014, como estamos? Estamos que vários Estados ainda não iniciaram as obras dos seus estádios e, segundo reportagem do jornal Folha de São Paulo, para o segundo semestre uma parte colocará gente para trabalhar à noite. E São Paulo, que já estava praticamente certa como abertura da Copa, não possui nem ao menos um estádio definido, uma vez que ninguém ainda deu garantias financeiras de que o chamado “Itaquerão” será erguido. Como a minha cidade é exatamente a citada, então, vou focar os próximos parágrafos nela.
São Paulo possui a maior frota de carros do país e o maior número de habitantes também. Algumas áreas do município sofrem seguidamente problemas crônicos de enchentes, falta de luz, falta de água, difícil acesso à educação e a hospitais. Seus dois aeroportos são um caos nos finais do ano. Embora eu ame demais essa cidade, tenho que admitir: falta muita coisa para podermos viver realmente bem.
Face a todas as dificuldades, o governo está para aprovar (até a publicação deste texto, a decisão ainda não havia sido oficializada) incentivos fiscais no valor de R$ 420 milhões para a construção da obra. Fico imaginando se esse dinheiro todo, não contabilizando os demais gastos previstos, fosse investido diretamente em, por exemplo, educação (subindo mais escolas, valorizando o trabalho dos professores, distribuindo material escolar de qualidade, reformando os espaços mais debilitados). Com certeza o retorno seria muito melhor, por uma razão simples: criaríamos cidadãos de verdade, que um dia fariam passeatas, reivindicariam melhorias, enfim, não seriam apenas espectadores da própria vida. Eu sonho que um dia esses R$ 420 milhões sejam colocados em saúde pública, melhorando o atendimento nos hospitais, o saneamento básico, o acesso a remédios. Talvez na construção de creches, outro problema desalentador para muitas famílias paulistanas – de acordo com o portal R7, daria para se construir 420 creches, as quais atenderiam mais de 50 mil crianças. E eu poderia citar ainda transporte público, arborização, criação de postos de emprego e mais um monte de áreas carentes de atenção. Mas não: vai tudo para um estádio.
Li sobre o prefeito, Gilberto Kassab, dizer que São Paulo lucrará R$ 1 bi com a abertura da Copa. Em outra reportagem, a Zona Leste vai ganhar R$ 30 bi em 15 anos. Um último dado antes de finalizar o post: a Alemanha, país desenvolvido, lucrou pouco mais de R$ 370 mi em 2006, dos quais R$ 106 mi foram diretamente para a FIFA.
Façam suas apostas. Eu já fiz as minhas.